Even-Zohar, Basmat 1998. "Entrada do Modelo do 'Hebreu Novo' na Literatura Hebraica".
Cadernos de Língua e Literatura Hebraica, n. 1. São-Paulo, pp. 33-46.
© Basmat Even-Zohar 1998
Também accesível de http://www.tau.ac.il/~basmat/abodot/bez-hebreu-novo.htm.

ENTRADA DO MODELO DO "HEBREU NOVO"
NA LITERATURA HEBRAICA*


Basmat Even-Zohar**

1

modelo literário do "hebreu novo", na literatura hebraica, de-
senvolveu-se, na prática, desde o período da haskalá, onde po-
dem ser encontradas as suas raízes, até o período da segunda
aliyá, como conseqüência das relações mútuas entre a literatura hebraica e
outros sistemas e, entre eles, outras culturas, outras literaturas, a imprensa ju-
daica e a ideologia sionista. A literatura hebraica adotou, nestes contatos, dife-
rentes detalhes de repertório e deles cresceu e cristalizou-se este modelo.
A descriçáo detalhada do modelo, do processo de cristalizaçáo e do
processo de penetraçáo no centro da literatura hebraica, assim como a descri-
çáo dos sistemas de cultura ligados a ele, podem ser encontrados na minha
pesquisa sobre "o hebreu novo" nos periódicos literários de 1880 a 19301.
Gostaria aqui, porém, de debater o tema a partir de um único ángulo: o
processo pelo qual o "hebreu novo" penetrou no centro da literatura hebraica
paralelamente a dois outros processos significativos na cultura hebraica: ini-
cialmente, o processo pelo qual a atividade sionista desligou-se do sistema
literário e transformou-se num sistema sócio-político independente e, em se-

* Publicado originalmente como "Knissat hadeguem shel 'haivri hehadash' lassifrut haivrit", SHAMIR,
Ziva e HOLZMAN, Avner (eds.). Nekudot mifnê basifrut haivrit vezikatan lemagaïm im sifruyot aherot, Tel
Aviv: Mechon Katz, Universidade de Tel Aviv, 1993, p. 187-200.
Traduçäo do hebraico por Naney Rozenchan.

** Universidade Aberta de Israel.

1 EVEN-ZOHAR, Basmat. A emergência do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica moderna, 1880-
-1930
. Universidade de Tel Aviv. Prof. Guideon Toury (orient.). Tese de Mestrado. 1988.

EVEN-ZOHAR, Basmat. Entrada do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica.

gundo lugar, o processo da passagem do centro da literatura hebraica do leste
europeu para a Palestina.

Considero que o modelo do "hebreu novo" desenvolveu-se ás mar-
gens da literatura hebraica, baseado em repertórios literários "antiquados", na
época em que no centro da literatura escrevia-se sobre personagens "da
diáspora" e "desenraizadas". Com a passagem da literatura hebraica para a
Palestina, o modelo novo penetrou gradativamente no repertório literário do
centro e, simultaneamente, continuou existindo no repertório periférico. Nes-
tes dois caminhos paralelos o modelo subiu gradativamente de categoria,
desde o ano de 1909 até o fim da década de 30. Como resultado de proces-
sos diferentes na literatura e na comunidade do país, o modelo elevou-se a
um lugar central na literatura hebraica nos anos 40.

Antes de descrever a entrada do modelo do "hebreu novo" na litera-
tura, abordarei, em resumo, os dois processos que mencionei: o desligamento
da política sionista da literatura e a passagem do centro literário para a Pales-
tina.

O "sionismo", na década de 80 do século passado, era principalmente
uma atividade espiritual-cultural-literária, voltada para a escrita de textos, que
eram considerados entáo parte da literatura hebraica, e seus redatores eram
denominados de "escritores". A ideologia sionista havia brotado dentro da
literatura hebraica e foi parte dela. Mas, com o impulso da atividade política,
a organizaçáo dos congressos sionistas e a passagem a uma atividade prática
na Palestina, nos anos 90 do século XIX, a açáo sionista começou a sair do
ámbito da atuaçáo cultural-literária apenas e tornou-se um sistema social inde-
pendente, cujo aspecto principal foi a açáo politica: consolidaçáo de partidos,
militáncia politica e económica, criaçáo de instituições, especialmente como
parte da construçáo da comunidade hebraica da Palestina.

Entre os anos de 1900 a 1930, modificam-se, porém, as relações entre
a literatura hebraica e o sionismo politico: eles ainda possuíam um ámbito
textual comum, o ámbito dos textos ideológicos (artigos, livros etc.), mas já
se criara a separaçáo entre ambos: existem menos partes coincidentes, já se
cria uma distinçáo entre pessoas e grupos que pertencem á "literatura" pro-
priomente dita ou á "política sionista"; começam a ficar claras, para cada
membro da cultura, quais atividades devem ser vistas como "literárias" e

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quais precisam ser vistas como "politicas". Mas ainda há uma certa coincidén-
cia nos seus órgãos de imprensa (literatura e política sionista juntas), nos textos
(de fato, propaganda de partido ou poesia de amor podem ser facilmente
atribuídas a um sistema ou ao outro, porém muitos artigos, ensaios etc., ainda
sáo comuns a ambos) e, naturalmente, existe conivência nos repertórios, ou
seja: os elencos dos modelos, os itens e leis que servem para comunicaçáo
cultural entre as pessoas e os grupos.

Como resultado da separaçáo das atividades que funcionaram até entáo
como um sistema para duas entidades distintas, ainda que próximas, surge a
questão das relações entre ambas. Quanto a isto, é preciso distinguir entre a
nossa compreensão atual da questáo do status dos sistemas e a concepçáo apa-
rentemente freqüente naqueles dias. A politica sionista prática transformou-se
no sistema condutor e dominante da nova cultura hebraica quase desde o mo-
mento da sua criaçáo: foi ela que estabeleceu as metas, criou novas funções para
a cultura e que cumpriu um papel central no estabelecimento de novas normas
etc. Paralelamente, o sistema literário foi perdendo sua posiçáo central.
Porém, estas modificaqöes na realidade politico-social náo penetraram
rapidamente nas percepções da cultura. Até a década de 30, a literatura conti-
nuou a se ver como importante e condutora; também o sistema político a viu
assim e necessitava da legitimaçáo e do suporte da literatura. Neste contexto,
o debate literário adquiriu um caráter novo e sagaz entre os que exigiam a
"literatura pela literatura" (autonomia literária) e os que exigiam a "literatura
pelo sionismo" (engajamento literário). O significado prático deste engaja-
mento foi a ativaçáo da literatura para expressar também nos seus textos
ficcionais a ideologia sionista; no princípio, um sionismo apolítico e, na se-
qüéncia, um sionismo político. O próprio fato de os partidos (o movimento
trabalhista, por exemplo) terem visto a necessidade de exigir uma literatura
que expressasse os seus valores, testemunha a grande importáncia que atribuí-
ram entáo a ela e ao seu poder de influéncia.

Na mesma época ocorreram grandes mudanças na própria literatura
hebraica: a literatura de que se fala em 1880 náo é parecida com a de 1930: as
diferenças sáo, entre outras, de lugar, de composiçáo de ativistas, dos repertó-
rios diversos, da estrutura diferente das instituições, do público diferente e,
naturalmente, de textos diversos. No início do período, o centro da literatura

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EVEN-ZOHAR, Basmat. Entrada do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica.

hebraica encontrava-se no leste europeu e começavam a criar-se dois centros
literários diferentes, um nos Estados Unidos (principalmente em Nova York)
e outro em Eretz-Israel. Todavia, como conseqüência das grandes mudanças
no sionismo politico e dos grandes abalos na Europa (as revoluções na Rússia,
a guerra mundial, a assimilaçáo e a emigraçáo que causaram a perda do públi-
co leitor hebraico), o foco passou para Eretz-Israel. Como se sabe, as primei-
ras tentativas de estabelecer um centro literário em Eret:Z-Israel foram feitas na
primeira década do século; Brenner colocou as bases iniciais significativas prin-
cipalmente na segunda década e a imigraçáo de Biafk com seu grupo para o
país por volta de 1924, simboliza de modo nítido a passagem do centro da
literatura hebraica para Eretz-Israel.

2

Até aqui apresentei, de forma simplificada, os dois processos que cum-
priram um papel importante na ascensáo do "hebreu novo"; passarei agora
para a observaçáo de modelos de personagens que abundavam nos repertó-
rios literários por volta de 1890 até 1910.

No repertório literário central predominaram, entáo, dois modelos (náo
se trata, naturalmente, de modelos únicos, porém de um conjunto de mode-
los): o primeiro era o modelo antigo e cristalizado do "judeu do exílio", em
que se destacavam personagens miseráveis e degeneradas da aldeia, e o outro
era o modelo novo da vanguarda literária, o modelo do "desenraizado" -
uma versáo diferente do "judeu do exílio". Estes dois modelos criaram a
maioria das personagens nos textos literários que foram publicados nos peri-
ódicos, e estavam ligados, naturalmente, também a outros componentes do
modelo padronizado, como enredo, ambientaçáo etc. De forma geral, pre-
ponderaram nesse repertório modelos do que era considerado entáo "reafs-
mo" literário, e os temas predominantes eram descriçáo da vida judaica nas
diversas diásporas (nos Estados Unidos, por exemplo, foram publicadas his-
tórias da vida dos imigrantes para a América).

A degenerescéncia, a feiura, a corrupçáo, a vida desgraçada e a deca-
dência que havia nestas histórias provinham, por um lado, dos modelos do

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realismo e do naturalismo europeus, mas na formaçáo das personagens ju-
daicas percebe-se nitidamente a observaçáo do mundo judaico através da
ótica negativa da ideologia sionista. É como se tivessem sido descritos os
judeus "tais como sáo" mas, na prática, foram tomadas as características apre-
sentadas inicialmente nas descrições do exílio feitas pelos pensadores do sio-
nismo, ou diretamente da fonte destas descrições - náo uma realidade judaica
verdadeira, mas os conhecidos estereótipos anti-semitas.

Na mesma época, alguns escritores periféricos, conhecidos como "os
escritores da primeira aliyá", desenvolveram em Eretz-Israel periférica um
novo modelo do judeu na literatura. A personagem principal nos contos de-
les náo era "o judeu do exílio" ou "o desenraizado" (se bem que "o judeu do
exílio" surgia freqüentemente nos seus contos num papel secundário, ressal-
tando ainda mais o caráter positivo da personagem principal), porém uma
personagem exemplar de judeu eretz-israelense corajoso e orgulhoso, ereto e
agradável, nativo e enraizado. Em contraste ao que é possível imaginar, que
este modelo provém de alguma realidade de Eretz-Israel, pois também ele
reflete convenções de um repertório literário, como os modelos "do exilio"
refletiam repertórios literários, sociais e ideológicos, o modelo foi construído,
principalmente, sobre o repertório romántico antiquado da literatura do
iluminismo, em contraste ao repertório realista que dominou o centro da
literatura hebraica de entáo.

O centro literário ignorou esta literatura ou a menosprezou ou até zom-
bou dela, mas no final da época ela foi criticada mordazmente pela vanguar-
da literária, representada por Yossef Chaim Brenner (por exemplo, em "O
gênero eretz-israelense e seus acessórios", de 1911). Se a situaçáo do sionismo e a
situaçáo da literatura tivessem permanecido como eram naqueles anos, talvez
esse modelo tivesse morrido e desaparecido. Porém, a história conduziu para
outra direçáo: a comunidade hebraica em Eretz-Israel foi se fortificando, o
centro da atividade sionista transferiu-se para Eretz-Israel, a literatura hebraica
começou a se mudar para o país, na Europa criou-se e cristalizou-se o ideal
da "hebraicidade" (por volta de 1905 a 1912), foi estabelecido o grupo
"Hashomer" etc.

Um dos resultados do surgimento das idéias da "hebraicidade" e da
segunda aliyá foram as modificações que ocorreram no modelo do "novo

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EVEN-ZOHAR, Basmat. Entrada do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica.

eretz-israelense" que se transformou no "hebreu novo". O "hebreu novo" era
um modelo diferente devido a alguns dos componentes básicos (conforme
detalhamento a seguir, na terceira parte). Como mencionado, este modelo
novo penetrou na literatura hebraica por dois caminhos paralelos. Num dos
caminhos continuou-se a escrever contos cujas personagens eram concretiza-
ções deste modelo. Esta ficçáo, que náo tinha posiçáo no sistema literário (ou
seja, uma ficçáo periférica) e que foi escrita de acordo com a norma de enga-
jamento literário, tornou-se cada vez mais popular entre os leitores. Essa po-
pularidade, junto com a elevaçáo na posiçáo da norma engajada por volta
dos anos 40, causou a ascensáo do modelo da "nova personagem hebraica".
Aliás, estas mudanças estavam vinculadas ao crescimento do status do sistema
politico por conta do declínio do status do sistema literário.

O segundo caminho de penetraçáo, mais importante e decisivo, náo
era um caminho de continuidade, mas um caminho no qual o modelo pene-
trou de modo parcial e em uma outra parte da literatura. Na prática, já desde
1909 o "hebreu novo" passou a penetrar no repertório central da literatura
hebraica, simultaneamente à passagem do centro literário para Eretz-Israel.
Nesta literatura, porém, o modelo náo penetrou como concretizaçáo com-
pleta ou como personagem principal, porém com introduçáo seletiva de com-
ponentes deste nos contos, em combinaçáo com os dois modelos diferentes
das personagens. A combinaçáo se fez de duas formas principais: ou as per-
sonagens eram construídas como junçáo de elementos do modelo tanto do
"hebreu novo" como também do "judeu do exílio", ou o conto apresentava
um conflito entre personagens "hebraicas" e personagens "do exílio". Em
todo caso, quanto mais próxima a personagem estava do "hebreu novo"
tanto mais ela era secundária no conto.

Esta introduçáo, filtrada na literatura central, brotou das diferenças do
status dos diferentes repertórios literários: por um lado, a posiçáo baixa do
repertório na descriçáo de Eretz-Israel em que foi desenvolvido o "hebreu
novo" e, por outro lado, a alta posiçáo central do repertório do exílio. Os
contos foram escritos por dois tipos de escritores: o primeiro tipo era de
jovens da vanguarda, que foram obrigados a trabalhar primordialmente no
ámbito do repertório central, se tinham pretensões de gozar de um status
literário. O segundo tipo era de escritores bem estabelecidos do establishment,

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que podiam escrever sobre o "hebreu novo" sem pór em perigo a sua pró-
pria posiçáo. Mas eles surgiram de dentro do repertório central e náo queriam
desistir das facilidades de seu uso e, por isso também, eles náo trocaram seus
modelos pelo modelo novo, mas combinaram um com o outro.

Aqui surge a pergunta: se o "hebreu novo" e o seu repertório estavam
numa posiçáo tão baixa e se a literatura já tinha um repertório literário crista-
lizado, útil e cómodo para a escrita de textos, por que surgiu a prontidáo de
arriscar-se e de usar um outro repertório novo e periférico?

Uma das respostas á pergunta se encontra nas mudanças que acontece-
ram na literatura e no sionismo: com a transferência para Eret. Israel, dimi-
nuiu na literatura o valor da descriçáo da vida dos judeus do exílio e da
"negaçáo do exílio" e cresceu a importáncia de uma nova funçáo: descrever a
criação da comunidade nova em Eretz-Israel para ós leitores do exílio e para
os pioneiros no país e formar a personagem do homem positivo e "desejá-
vel" para os sionistas no lugar do "disponível" negativo. Essa era uma funçáo
cultural geral, ideológica, social, política, mas também literária. Para preencher
esta funçáo na literatura já existia um repertório literário pronto para descri-
çáo da vida eretz-israelense. Entretanto, este repertório era desprestigioso e
cheio de detalhes que pareceram ao centro literário como velhas sucatas; era,
porém, cristalizado e acessível.

Mas também a funçáo nova de descrever a "vida que estava ocorren-
do em Eretz-Israel" e o homem novo que se desenvolve no país, assim como
a exigência de mobifzaçáo literária náo brotaram no espaço vazio e sim, no
ámbito do sistema literário com suas instituições, seus homens, a relaçáo de
forças e os seus repertórios. De acordo com isso, a explicação deste desen-
volvimento, em termos da "resposta direta" da literatura á "exigência ideoló-
gica", como está descrita em várias pesquisas, náo convence. Pode-se explicar
o seu surgimento apenas num desenvolvimento complexo dentro da própria
literatura, em cuja seqüência ocorreram modificações tanto no repertório Ete-
rário central como no modelo do "novo hebreu".

Entre 1910 e 1940, aproximadamente, desenvolveu-se, portanto, o
"hebreu novo" também na literatura periférica "engajada" em que se concre-
tizou, quase integralmente, num sem número de histórias de pioneiros cons-
trutores do país, e também na literatura central, em que ele foi entretecido nos

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modelos "dos judeus do exílio" e do "desenraizado", até que, nos anos 40,
transformou-se em modelo central da personagem literária, na versáo do
gabar, o nativo de Eretz- Israel.

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A seguir, desenvolvo uma reflexáo sobre os detalhes de alguns dos
temas, a respeito dos quais apresentei apenas colocaçöes gerais. Os autores, os
periódicos e os textos de que falamos: o corßus dos contos, cujos modelos de
personagens eram concretizações diferentes do "hebreu novo", abrangeu um
total de cerca de vinte e cinco contos apenas, que foram encontrados num
levantamento de cem periódicos literários; destes, de seis a nove descrevem
de fato "eretz- israelenses novos" e náo "hebreus novos": contos de Zeev
Yaavetz, Shmuel Rafaelóvitsh, Yehoshua Barzilái-Eisenstadt e Mosh¿ Smilanski.
Entre os escritores de contos que abrangiam a personagem do "hebreu
novo", repetem-se oito nomes conhecidos, dos quais cinco foram também
editores de periódicos literários: A. Z. Rabinóvitsh, que publicou dois contos
("Piedade" em Ha-nir, 1909 e "A vovó rejeita e a vovó aproxima" em Ha-
adamá
, 1920), e David Shimonóvitsh, que publicou dois contos ("Pátria" em
Ha-olam, 1910 e "Conterráneo" em Miclat, 1920). Y D. Bérkovitsh publicou
"O motorista" em Moznáyim, de que era editor; Kadish Yehuda-Leib Silman
que, entre outras coisas, editou junto com Yaakov Fichman um periódico
com o título Ha-áret7, publicou "A senhora Fínkel" (Bentáyim,1913) e Fichman
publicou em uma coletánea que editou (Nissan, 1930) um conto infantil com
o título "Os defensores de Sdê Kerem" e três contos ("Hawadja nazar" em
Ha-olam,1910; "Avner" em Molédet,1913 e "Flana" em Ha-galil,1919). Yehoshua
Barzilái ("A primavera chegou" em Ha-ivri He-hadash,1912), e Aharon Reuvéni
que publicou tr¿s contos ("Junto á parede", originalmente em ídiche; sua tra-
duçáo foi publicada em Kôvetz Sifruti, Coletánea Literária, 1914; "O amor de
sua alma" no Sêfer ha-shaná shel Erete-Israel, Livro do Ano de Eretz-Israel
1926; "Auge de sua força" em Moznáyim, 1929).

Alguns contos foram escritos por escritores menos conhecidos: L. A.
Orlof, "O jovem Búnia" (Bentáyim,1913), Yossef Ben-Porat, "Cresceu" (Molédet,

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1912), "Na Galiléia" (Ha-galil, 1919), Yossef Luidor, "Yoash" (Ha-shilôah,
1912), Ariê Shimóni publicou uma peça com o nome de "Os construtores"
(Ha-ezrah,1919), e I. Talush (Ísser Mosseleivitsh-Talush), "A ofensa" (Ha-shilôah,
1914). Todos os escritores periféricos novatos, Levi Ari¿ Arieli-Orlof (imi-
grou em 1909, foi para os Estados Unidos em 1923), Yossef Ben-Porat (imi-
grou para a Palestina em 1908, posteriormente foi diretor-geral do Departa-
mento de Solos de Israel), Yossef Luidor (assassinado junto com Brenner nos
conflitos de 1919-20) e Ísser Talush (imigrou na segunda aliyá e foi para os
Estados Unidos por volta de 1914) eram pioneiros sionistas na época referi-
da, ligados ao movimento trabalhista. Também Reuvéni, irmáo de Yitz'hak
Ben-Tzvi, (que viria a ser o segundo presidente do país) foi entáo membro do
movimento trabalhista mas, pelo visto, náo trabalhou como operário.

Náo é por acaso que os cinco contistas, pertencentes ao establishment,
eram também editores de periódicos, já que naqyele período a atividade da
literatura hebraica baseava-se primordialmente na iniciativa organizacional (edi-
çáo e criaçáo de grupos etc.), e quem "apenas escrevesse textos" encontrava-
se geralmente na periferia. O que nós sabemos sobre esta época é que tam-
bém náo por acaso os cinco (ou seis, se Ari¿ Shimóni, o desconhecido, foi um
pioneiro que escrevia) escritores periféricos iniciantes pertenciam á segunda
aliyá e eram ligados ao movimento trabalhista, e os dois escritores periféricos
"antigos", Smilanski e Barzilái, pertenciam á primeira aliyá.

Verifica-se, portanto, que do ponto de vista do número de escritores, o
modelo do "hebreu novo" teve uma difusáo que foi ainda mais reduzida do
que a que foi expressa na quantidade de contos: cerca de vinte contos foram
escritos por um grupo reduzido de treze escritores apenas, dentre eles quatro
eram também editores de periódicos que publicaram textos descritivos do
"hebreu novo". Sendo assim, de um lado, a porcentagem considerável das
pessoas do establishment demasiadamente centrais entre os redatores, e tam-
bém entre os escritores, testemunha que, neste período, o modelo já tinha
penetrado no repertório central da literatura hebraica. Mas, por outro lado, o
número pequeno de textos e de escritores, assim como também a posiçáo
relativamente periférica da maioria, testemunha a situaçáo periférica deste re-
pertório.

Como, entáo, foi descrito o "hebreu novo" nestes textos?

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EVEN-ZOHAR, Basmat. Entrada do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica.

É claro que toda descriçáo do modelo é apenas uma abstraçáo das
suas materializações concretas nos textos. Esta abstraçáo é baseada náo ape-
nas na indicaçáo explicita ou aludida das características do texto, mas tam-
bém, na análise das características contraditórias do modelo que apareceram
no texto e outros modos que testemunham o modelo básico, aos quais os
escritores se referiam. O "hebreu novo" que se pode abstrair dos contos é,
portanto, um judeu jovem, pioneiro (em geral um agricultor que trabalha ou
na moshavá ou na kvutsá, colônias cooperativas ou coletivas, ou vinculado á
agricultura como um guarda), amante do trabalho, ligado á natureza, apaixo-
nado pelo país, ativo, corajoso, forte e bravo, ereto, saudável e bronzeado,
risonho, que canta e dança, tranqüilo e confiante, rigoroso, idealista e ético.
Estas características sáo descritas exatamente com essas palavras nos textos,
como a descriçáo dos trabalhadores no conto "A ofensa", de 1. Talush, como
"rapazes altos, eretos, saudáveis e bronzeados", ou a descriçáo da persona-
gem principal do conto "Yoash", de Luidor, como "um jovem hebreu exem-
plar aplicado, amante do trabalho, corajoso como convém a um nativo dos
`montes de Judá`.

Mesmo características como a ética sáo apresentadas, náo menos ex-
plicitamente, como no conto "Piedade" de A. Z. Rabinóvitsh: Avner, que é o
personagem principal mais "hebreu" do conto, decide, em conseqüéncia do
assassinato de um de seus companheiros na moshavá, ir para Iafo a fim de
testemunhar como se tivesse visto um certo árabe matando seu companheiro,
pois ele tinha certeza da culpa do árabe. "Desde o início andou Avner conten-
te e satisfeito. Armado, cheio de coragem, e sem qualquer dúvida em seu
íntimo, porque estava indo fazer o certo e o direito", porém, no fim ele
decide náo jurar em falso, e justifica-se: "nós somos um povo pobre, respon-
deu Avner - nosso sentido ético é desenvolvido em demasia e nós somos
obrigados a conviver com selvagens amorais. Eu náo posso mais ir jurar -
vamos voltar". É claro que esta lista de qualidades revela claramente que o
"hebreu novo" é construído como oposiçáo consciente aos modelos do "ju-
deu do exílio".

O hebreu tem em geral um nome, entendido no ámbito do modelo
como "um nome hebreu novo": nomes de heróis ou de personagens virtuo-
sas da bíblia, como por exemplo Avner (aparece duas vezes), Nadav, Yig'al,

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Daniel, Aminadav, Yehonatan ou Yoash. Sáo geralmente nomes bíblicos que
eram incomuns entre os judeus, em especial nas comunidades do leste euro-
peu. Mesmo assim, os nomes mais comuns nos contos sáo ainda nomes
hebreus bíblicos, que também sáo nomes judaicos tradicionais. Mas esses no-
mes náo sáo assinalados como do "exílio" no repertório literário, especial-
mente porque apareceram nos contos em sua forma original, em contraste á
sua forma ashquenazita como Tzvi (duas vezes), Avraham, Binyamin,
Menachem, Shim'on, Yaakov, Shlomó, Baruch, (em oposiçáo á "Avreiml" ou
a "Yánkele'~. Estes nomes, por um lado, náo frisam a "nova hebraicidade"
mas, por outro lado, cumprem totalmente tanto a exigência da "hebraicidade"
quanto as exigências do realismo literário, pois estes eram realmente os nomes
hebreus mais comuns entre os judeus. Cerca de cinco contos náo indicam o
nome da personagem "hebréia" e assim evitam o problema.

Em contraste com os contos que se "esquivam", encontram-se contos
que tratam explicitamente de nomes das personagens ou atribuem nomes que
se destacam pela sua artificialidade: na literatura da primeira aliyá foram dados
ás personagens nomes do repertório bíblico antigo como "Shaul Ha-Yitz'hari"
no conto "15 de av na Palestina", e nomes desse tipo continuaram a aparecer
também em contos posteriores como "Binyamin, o galileu", de A. Z.
Rabinóvitsh. No conto de David Shimonóvitsh, "Ben-Artzi", Meu conterráneo,
há uma relaçáo explicita da vinculaçáo do nome com a personalidade "hebréia"
nova: o nome verdadeiro de Ben-Artzi é Naftaf, mas ele se apresenta como
"um homem hebreu da terra dos hebreus e que tem um nome hebreu", e
troca incessantemente o seu nome hebreu para "Ben-Ami" (filho do meu
povo), "Yig'al, o galileu" ou "montanhês", de acordo com o lugar que traba-
lha no país e de acordo com a vontade.

Os contos que trazem nomes acentuadamente utilizados no exílio - ou
seja, nomes judaicos estrangeiros - sáo também os mais complexos, mas náo
descrevem o "hebreu novo" estereotipado (com as características já mencio-
nadas), porém uma mistura do "hebreu" e do "que vive no exibo". Por exem-
plo, nos contos de Reuvêni e de Silman, surgem nomes como Vêlvele, Fínke1
e Dushkin, ao lado de nomes como Zárchi ou Yechiel Katz. A parte "do
exílio" do nome é geralmente o sobrenome, fato adequado também á reaf-
dade comunitária judaica e eretz-israelense da época.

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EVEN-ZOHAR, Basmat. Entrada do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica.

Há um motivo razoável para se supor que os contos que indicam só os
nomes próprios ou que evitam dar o nome da personagem descrita (a maio-
ria dos contos), tentam ser fiéis, por um lado, ao ideal do "hebreu novo", que
náo pode portar um nome estridente do exílio e, por outro lado, á "realida-
de" na qual um nome que é totalmente hebreu se sobressai na sua artificialidade,
mesmo quando as personagens nasceram em Eretz-Israel. Os contos mais
complexos simplesmente náo foram escritos com essa exigência e talvez até o
próprio uso de nomes do exílio foi destinado a simbolizar neles a ligaçáo
com a literatura central e com isto seu nível literário mais alto.

Como exemplo destes contos complexos, nos quais foi introduzido o
"hebreu novo" no repertório literário de centro, é possível trazer o conto de
A. Z. Rabinóvitsh, "A vovó rejeita e a vovó aproxima". Rabinóvitsh é um dos
escritores do establishment que escreveu também contos "Eretz-israelenses".
Ele apresenta nos seus contos "hebreus novos", mas eles náo sáo as persona-
gens principais dos contos. A personagem, atrás da qual está o narrador, é a
que conserva algumas características do modelo "do exílio". No conto é
descrita a tensáo entre dois ou três personagens que se encontram na seqüên-
cia entre "hebreu novo" e a "personagem antiga da diáspora": a personagem
principal é Avraham, o operário, cujas características que se desviam do mo-
delo do "hebreu novo" sáo: amante da paz, mal sucedido na guarda, quieto,
modesto, sensível, preocupado, temeroso em revelar o seu amor por Shoshana
e que demonstra cansaço e fraqueza quando fica com malária. Seu compa-
nheiro é Binyamin, o galileu, e eles "por natureza eram sempre de opiniáo
contrária, em absoluto". "Todo heroísmo e sentinela" de Binyamin, o guarda
corajoso, "eram estranhos a Avraham, que trabalha em siléncio e que vê no
trabalho o objetivo de sua vida". Porém, Binyamin, que era aparentemente o
"hebreu novo" vitorioso, que consegue o amor de Shoshana e vive com ela,
foi morto numa noite de vigilia e Avraham, que suplantou a malária, sobrevi-
ve e se casa com Shoshana grávida, que "náo o abandonou desde entáo",
como está escrito no fim. Avraham, e náo a personagem exemplar Binyamin
é, portanto, o verdadeiro vitorioso.

Como foi dito, as diferenças entre o "hebreu novo" e o "eretz-israelen-
se novo" que o antecedeu, náo existiram só em nível concreto do modelo das
personagens dos contos, ou seja, que o "eretz-israelense" é o herói do conto e

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Cad. Líng. Lit. Hebr., n. 1, p. 33-46, 1998.

o "hebreu" tende a ser a personagem secundária, ou que o "ereta-israelense"
tende a ser a concretizaçáo "completa" do modelo enquanto o "hebreu", na
maioria das vezes, é mesclado a modelos "do exílio", mas já no nível do
modelo. Apesar da grande semelhança entre os dois modelos, como se pode
abstrair dos diversos contos, ainda assim há importantes diferenças entre eles:

1. "O judeu eretz-israelense novo" é quase sempre nascido na Palestina,
na maioria das vezes em moshavot, ou membro da antiga comunidade que se
agregou ás moshavot. Ao contrário dele, o "hebreu novo" é quase sempre
nascido no exílio e imigrou para Eretz-Israel como pioneiro (as únicas exce-
ções sáo crianças, pois a funçáo pioneira náo é táo significativa para elas e, por
isso, a sua característica destaca a "hebraicidade" e sua idade jovem destaca a
"novidade" e "esperanças no futuro'.

2. "O judeu eretz-israelense novo" tende a ,ser agricultor, proprietário,
mas o "hebreu novo" tende a ser pioneiro, trabalha como operário assalaria-
do ou guarda. Esta diferença reflete a distinçáo entre a ideologia do "Hibat
Tsion" e a primeira aliyá em relaçáo á segunda aliyá e ás idéias do movimento
trabalhista.

3. O "eretz-israelense" mantém uma ligaçáo com modelos románticos
do "hebreu ancestral" que foram criados principalmente na cultura germánica,
na arqueologia, na lingüística e em outros sistema da cultura européia e que
foram adotados pela cultura iluminista hebraica. Esta ênfase foi substituída no
"hebreu novo" pela ligaçáo com modelos russos diferentes, literários e so-
ciais.

4. Os contos que descrevem o "judeu eretz-israelense novo" tenderam
a salientar que o herói ou a heroína falam hebraico. Este componente perdeu
sua importáncia com o "hebreu novo": na maioria dos contos é óbvio que as
personagens falam hebraico e os escritores náo viram nenhuma necessidade
de frisar isso.

5. O "hebreu novo" tende a expressar opiniões ideológicas nos con-
tos, em geral trata-se de ideologias sociais ligadas ao movimento trabalhista.
Por outro lado, o "eretz-israelense novo" náo expressa ideologias sociais. Se
ele se refere a valores, apresenta os valores románticos do renascimento e do
Hibat Sion que tocam mais a moldagem do ser humano como indivíduo do
que como sociedade.

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EVEN-ZOHAR, Basmat. Entrada do modelo do "hebreu novo" na literatura hebraica.

6. O "eretz-israelense novo" ainda mantém um diálogo com o "judaís-
mo" no sentido antigo: ele é religioso mesmo ou mantém a tradiçáo (de
acordo com a ideologia de Hibat Sion) ou, ao contrário, negligencia a religiáo
ou a renega (uma relaçáo existente na ideologia da "negaçáo do exílio', e isso
é acentuado nos contos. Por outro lado, o "hebreu novo" em geral náo revela
ligaçáo alguma com a religiáo. Com base nas referéncias a esse fato naquele
período (de Klausner, por exemplo, em seu artigo "A naçáo antiga em sua
renovaçáo", 1938), com base na "literatura da primeira aliyá", e até de acordo
com a ficçáo "do exílio", destaca-se este esquivar-se do modo de vida judai-
co como uma auséncia que náo é ocasional.

Em resumo, nos contos que apresentaram o "eretz- israelense novo",
predominou, portanto, a tendência de apresentar sociedade e pessoas "ide-
ais" que existem como que no presente e que estivessem exemplificadas de
acordo com um passado antigo recomposto - trabalhadores enraizados na
terra, nativos, independentes e falantes do hebraico, num período em que a
pequena comunidade hebréia nova sobrevivia ás custas do Baráo e falava
ídiche e francês e a segunda geraçáo, em sua maioria, abandonava o país. Por
outro lado, o "novo hebreu" está ligado ao repertório literário que apresenta
sociedade e pessoas num processo de desenvolvimento, cujos objetivos seriam obti-
dos no futuro, num período em que esses objetivos começariam realmente a
se concretizar e nisto estio envolvidos também o abandono da ênfase no
"hebreu antigo", no ser nativo e na fala hebraica.

Quando o modelo literário do "hebreu novo" se transformar num
modelo central da personagem na literatura hebraica dos anos 40, de novo
náo se tratará do mesmo modelo descrito aqui, mas de uma metamorfose
adicional conhecida pelo nome de "a personagem do tzabar". Mas isso já é
outra história.